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Ato teatral com Carlos Fariello [como Hélder, o adolescente]

1ª. ENTRADA

BLACK-OUT TOTAL. HOUVE-SE A VOZ DA MÃE GRITAR:

- HEL-DERRRR!!!

INÍCIO DA MÚSICA RÁPIDA COM AS FRASES DA MÃE ENTRECORTADAS:

- Helder, meu filho, já tomou banho hoje?
- Helder, saia já desse computador!
- Helder, desliga esse celular...
- Chega de televisão por hoje, Helder!
- Helder, mamãe vai trabalhar. Vê se come, hein?
- Leva uma malha, vai esfriar!
- Helder, isso são horas de chegar?
- Abaixa esse som!
- Cadê você, Helder?
- Cadê você, menino?

FLASH DE LUZ NO PALCO. NO CENTRO DELE, HELDER DIZ:

- Tô aqui, meu!

IMEDIATAMENTE A LUZ SE APAGA E, ENQUANTO ROLA O SOM DA MESMA MÚSICA,  ACENDE-SE O TELÃO QUE APRESENTA UM CLIP COM DEZENAS DE IMAGENS DE TODO O UNIVERSO JOVEM E ADOLESCENTE. NESSA COLAGEM, PODE TER AS FOTOS ENVIADAS PELOS CENSORS, BEM COMO SEUS CARTAZES. ENQUANTO ISSO, HELDER, VAI PARA UMA LATERAL DO PALCO E SENTA-SE NUMA CADEIRA GIRATÓRIA FRENTE A SEU “POLEIRO” -  UM MÓVEL ONDE ESTÁ INSTALADO SEU COMPUTADOR E VÁRIOS OBJETOS SEUS (TIPO UM BONECO DO SHRECK, UMA LUMINÁRIA, ALGUNS LIVROS, CDS...). NA OUTRA LATERAL DO PALCO, SOB UM PEQUENO TAPETE, ALGUNS PUFS OU UMA POLTRONA. POSTERS PELAS PAREDES – UNIVERSO DO ADOLESCENTE.

- Véio, vou te falar, viu? Minha mãe me trata como se eu tivesse 15. E eu já tenho 16, cara!

Pô, ainda bem que a gente só tem uma mãe porque se a gente tivesse duas, eu me suicidava muito, meu.

A coroa é do bem, mas é super mega hiper estressada. Outro dia, ela tava reclamando que eu vivo na frente do computador, que eu sou o maior sem-noção mas... pô, mermão... eu já nasci conectado. Meu cordão umbilical já tava online.

Ela vive reclamando de tudo: que eu não estudo o quanto devia, que eu não saio do celu. Pô, meu, meu celu é meu companheiro, tá? Ele é o cara que me acompanha, que me entende, que me ouve... Outro dia, ela pegou meu celu e bateu com ele na minha cabeça. Tô ouvindo sinal de ocupado até agora. Tô me sentindo uma chamada a cobrar não-identificada.

A Mamis trampa o dia todo, sabe? É uma executiva. Sei lá o que ela executa, mas o que sei dizer é que, quando ela tá em casa ela só reclama. Mó estresse, meu, mó estresse.

Agora ela cismou que eu levo a vida na flauta, que eu já tô grandinho, que tá mais do que na hora de eu escolher o que eu vou ser quando crescer... Cara, eu fico assim meio perturbado, percebe? Perturbado com esse lance. Eu confesso: eu sei que eu já sou meio desorientado por natureza mas, meu, sou muito novo pra decidir o que eu vou fazer pro resto da minha vida. Eu acho que essa é a hora em que a gente tem que divertir, sair pras baladas, beber com os amigos, ficar com as minas. Mas tem sempre um adulto te apontando o dedo e cobrando o futuro que é teu, meu!

Tipo assim. Claro que eu penso no que fazer no futuro – só não sei o que. Tem que ser uma profissão bem CABEÇA, meu! Psicologia... é bem cabeça, né? Cirurgia do cérebro... não, não curto sangue, eu desmaio...  Cabelereiro... também cuida de cabeça, né? Não... minha mãe ia se aproveitar muito de mim... Roqueiro é bem cabeça... pelo menos, já tô deixando meu cabelo crescer! Hehe...

E vamos combinar, véio, que esse papo de futuro, de cursinho, de facul dói, cara, fere a gente, falei?

Aí, quando a gente se joga num shopping e se tranca lá o dia inteiro, é pra fugir dessa cobrança, é pra ter um pouco de paz. PAZ! (faz o gesto) É, tô por dentro desse lance. Mas vamo que vamo, né?

Sabe, eu reclamo da coroa mas eu tenho que admitir: ela faz tudo por mim, eu sou um privilegiado. Ela me ama, cara, e eu amo ela! Eu vejo tantos jovens, tantos adolescentes como eu, perdidos, largados... Eu acho que, se ela não pegasse tanto no meu pé, eu ia sentir a mó falta, viu?

Tipo assim... Quando eu tô junto da minha turma e a gente troca uma idéia, eu percebo que eu sou cheio de conceitos, cara, que foi minha mãe que me deu. Ela chama isso de VALOR. Valor não é só a soma da tua mesada, cara, é aquilo que tu tem por dentro... E eu sinto que tenho muita coisa dentro de mim, não só os pulmões, cara, o fígado, os intestinos grosso e delgado... mas também um monte desses valores. Meu, eu me sinto um frango assado de padaria... Hehe... Cheio de farofa, falei?

Eu adoro meus amigos, queria muito que vocês conhecessem essa turma. São um bando de sem-noção, mas muito maneiros. E eu sinto que, além da amizade, eles também têm os tais valores que a mamis fala... Tem de tudo na turminha. Tem mina-patricinha, mas que tá tentando um intercâmbio pra aprender uma nova língua. Tem aqueles que já se decidiram pela profissão e até pela faculdade que vão fazer. Tem outros com menos grana, que já dão um trampo pra garantir uns trocados. Tem de tudo. Mas você percebe, cara, que todo mundo tá preocupado com o futuro. Com o mundo em que a gente vive, com a violência... Jovem alienado é um animal em extinção, cara!

Pô, meu, tô viajando né? Tô falando mais que a mamis. Meu, quer saber? Vou apresentar ela pra vocês. Vem cá, mamis... (traz  a Sonia pro palco) Olha que enxutassa que ela é!

SONIA – Ora... eu tenho filhos mas você não é um deles, não!!!

HELDER – Meu, tá vendo? Tipo assim: a senhora me renega e depois eu vou ter que gastar a maior grana com terapia... Pô, meu, a gente não pode elogiar.... (vai saindo)

SONIA DISCURSA.


2ª. ENTRADA DO HELDER

Caras, tô super energizado... Olha só o que me aconteceu. Eu conheci uma gata que trabalha com a mamis e ela me convidou pra fazer um estágio na empresa dela. Ela me deu uma câmera e pediu pra eu gravar coisas importantes da minha vida. Disse que isso é um tipo de pesquisa importante pra entender nós, jovens. Meu.... sem-noção! Eu imediatamente saí gravando meus amigos. Sim, porque se tem alguma coisa que eu prezo, cara, acima de tudo, acima da lei, do bem e do mal, é a amizade. E eu tenho muitos amigos, não só os virtuais do orkut, do MSN, mas pessoas reais de carne e osso, seres humanos total, falei? E eu escolhi meus amigos mais chegados aqui de Sampa e de outras paradas do país pra mostrar. Meu, tá ficando show. Querem ver? Olha só!


HELDER APERTA UMA TECLA DO COMPUTADOR. NO TELÃO, APARECE O CLIP DE LARISSA. QUANDO ACABA, HELDER COMENTA:.

- Vocês ouviram a Larissa dizer que vai fazer intercâmbio na Austrália. Meu, eu queria ir também, mas imagina se eu falo isso pra minha mãe? Ela é capaz de me guardar na bolsa dela que nem um canguru só pra eu não ir. Olha o próximo: é o Pedrão.

HELDER APERTA UMA TECLA E VÊ-SE O CLIP DE PEDRO. AO FINAL, HELDER COMENTA:

- O Pedrão é um dos meus mais chegados. Ele é um mano muito humano, cara, muito humano: vive preocupado com a satisfação do próximo. Agora, pra finalizar, a Thamires – que é filha da minha babá, a Cris... EX-BABÁ, né? Hoje eu não tenho mais babá, cara, já tô grande!

NOVAMENTE, HELDER APERTA UMA TECLA DO COMPUTADOR, E O CLIP DE THAMIRES APARECE. AO FIM, ELE DIZ:

- Como a mãe da Tammy trabalhava aqui em casa, a gente cresceu juntos. A Thammy é muito poderosa, cara, e eu acredito muito nessa maninha. Força, muleka! É isso aí? Tô mó ligado nesse meu novo trampo. Querem conhecer a gata que me convidou? Entra aí, Jeni...

JENI DISCURSA.