O ÍNDIO ADOTADO







Anauê! Mim, Pikachu Kaiová! Mim, índio brasileiro! Mim... não vai ficar falando assim porque eu sei falar direito (Índio globalizado!) Eu sou da Tribo dos Tucuruvis, que fica lá em Roraima. E é verdade, Roraima existe sim. Minha tribo, pra quem quiser jogar no Google Maps, fica entre a Tribo dos Mimimis e a dos Kakakas!

Vocês devem estar se perguntando: “Mas como assim, um índio loiro, de olhos azuis, com essa tez alva, todo nórdico?”

Quando criança, eu brincava feliz com os indiozinhos da minha tribo até que, um dia, uma índia jacira, uma magoada da Tribo dos Kamurás-Exú começou a falar: “Olha esse índio, olha a cor dele, ele é bege, ele é estranho, deve ser um índio fake...!” A partir daquele dia todo mundo começou a me olhar de forma diferente! Da mesma maneira que vocês estão me olhando agora. Vocês acham que eu nunca me questionei sobre isso? Claro que sim, desde o dia em que vi a minha imagem refletida nas águas do rio.

Naquele momento, comecei a me trancar na minha taba e a viver a síndrome do patinho feio – sabe aquele patinho pretinho básico adotado pela mamãe ganso, que nadava no meio dos irmãozinhos, os gansinhos branquelos? O pior é que eu não tinha com quem dividir minha dor, não havia terapeuta, psicólogo, não tinha um Drauzio Varela naquela tribo. E eu acabava desabafando com minha arara de estimação, uma arara bonita, colorida mas que só ficava repetindo “Esquisito, esquisito” o tempo todo. Eu não podia me abrir com ela que ela “Esquisito, esquisito!” Isso reforçava meu recalque. De tanto ouvir “Esquisito, esquisito, esquisito” um dia estrangulei a maldita arara... Foda-se o Ibama! Foi pena colorida pra todo lado. Fiz até esse cocar!

Diante desse drama, eu pensei: das duas, uma ou eu sou um índio albino ou eu fui adotado! Essa crise me levou a buscar o conhecimento, a pesquisar as lendas do meu povo. E entre todas elas, uma fez bastante sentido pra mim.

Reza a lenda que, nos idos da década de 60, um casal de botânicos ingleses, com seu filho recém-nascido (um bebê loirinho, lindinho, podia até ser filho da Lady Di...), explorava a Amazônia quando se deparou com uma enorme vitória-régia. No que subiram na planta pra fazer uma selfie, veio uma pororoca furiosa e engoliu violentamente o casal. O bebê foi lançado às águas mas, milagrosamente, foi levado por um boto cor-de-rosa até às margens do rio onde a índia Castorina lavava seu cabelão. Castorina pegou o pequeno orfão e começou a cantar pra ele: (canta) “Mocoi vuraí, oicovadeé sherogarerê gará putombê, guatiámimi e jiuro pequê entuion devejã...” Isso é tupi-guarani. É uma lingua. Existe sim!

Enfim, Castorina adotou o inglesinho e o levou para crescer em sua tribo. Eu assumi essa história como minha e fiz de tudo pra me sentir parte daquele lugar. Ficava horas esticado ao sol como uma lagartixa pra pegar uma cor, mas virava um camarão. Tomava cápsulas de betacaroteno, passava tintura de urucum, óleo de buriti na pele mas, a cada banho de cachoeira, voltava esse branco “Omo Total Multi-ação”!

Até um dia que a gente soube que a Globo ia gravar uma novela lá na aldeia e eu pensei: eu não quero mais ser o esquisitinho do Plim-Plim. Índio não paga mico em cadeia nacional!

Então eu tive uma ideia: olhei pra minha terra, a terra da minha tribo, uma terra avermelhada, escura, densa, tinha chovido, ela estava molhada, o que que eu fiz? Comecei a passá-la por todo meu corpo todo e fiquei lá secando. Quando o povo da televisão chegou, eles olhavam pra gente fascinados. Provavelmente nunca tinham visto um índio de verdade na vida... Só aqueles índios da Tribo Projac... índios de novela, aqueles bem malhados, produzidos, maquiados... índio que não dorme em rede, só em sofá de diretor... Cala-te boca...

Até que, de repente, uma velha atriz, cabeluda, bocuda, pernuda, coxuda me viu, voou pra cima de mim e começou a me agarrar. Gente, me deu um medo porque a mulher parecia uma capivara faminta querendo me engolir. E ela era velha, velha, velha e bem louca. Aí o povo da tv falou: “Suzana Vieira, larga o índio!” Mas ela não me largava, se esfregava em mim e dizia no meu ouvido: “Eu sou uma diva brasileira, eu sou amada pelo povão e não tenho paciência com índio que tá começando...”

Niqui ela foi se esfregando em mim, ela foi se bezuntando com a lama do meu corpo e, naquele momento, na frente de todos, o milagre se fez: ESSA MULHER COMEÇOU A REJUVENESCER! A pele dela foi ficando lisa, os cabelos mais bonitos, até o peito dela que eram duas muxibinhas caídas foi ficando mais empinado... (um deles até apareceu no Faustão!) Hoje ninguém diz que ela tem quase 150 anos, é a força da lama!

E foi aí que a luz se fez: eu percebi que a lama da minha tribo era rejuvenescedora. Uma lama milagrosa! E como um bom índio empreendedor, com visão para business e marketing, resolvi capitalizar em cima e tô lançando... “DÁDIVA, A LAMA DA DIVA”. Solta o merchan!

MERCHAN EM OFF - Você vai se surpreender com a novidade. Proveniente de terras indígenas curativas, é um produto perfeito pra você que está rapidamente se deteriorando. Faça como a diva Susana Vieira e use “DÁDIVA, A LAMA DA DIVA!” Disponível nas versões pequeno, médio e grande.

Esse é o potinho econômico (mostra um pote enorme). Lá na tribo não tem miséria!

Bem, diante dessa descoberta e do sucesso da ideia é que eu saí lá de Roraima e vim aqui pro eixo, procurar o Silvio Santos. Sim, porque esse é um produto perfeito pra ser comercializado pela Jequiti, não é? Haviam me falado que o Silvio estaria aqui no teatro mas, quando eu cheguei aí na porta, me disseram que aqui ia rolar um show de “humor”... Show de Humor? Hummmm, eu estava lá trás ouvindo e não achei a menor graça... Deve ser humor branco!

Enfim, a hora em que eu achar o Silvio eu tenho certeza que nós juntos mais “Dádiva, a Lama da Diva” colocaremos Roraima definitivamente no mapa!

Enquanto isso, eu tô procurando representantes da marca aqui em São Paulo, eu tô abrindo as divisas. Quem tiver desempregado - ou como vocês preferem dizer “à disposição do mercado” (e pela carinha de vocês eu vejo que tem muita gente aqui disposta no mercado...) – pode entrar em contato comigo pelo site www.indiochupaateocaroco.com.br 

Por ora, fica aqui meu abraço pra vocês... Erê!!! Fui.